O Japão tem a maior média de expectativa de vida do mundo, segundo
dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) e das Nações Unidas (ONU), e
o segredo não é somente a alimentação, como se pensava.
Segundo Kenji Shibuya, professor do departamento de política global de
saúde da Universidade de Tóquio, as razões da longevidade japonesa têm
tanto a ver com o acesso a medidas de saúde pública quanto a uma dieta
equilibrada, educação, cultura e também atitudes de higiene no
dia-a-dia.
O especialista e uma equipe de pesquisadores estudaram vários aspectos
da cultura, da política e da economia japonesa que influenciam na forma
de viver da população e publicaram o estudo no jornal médico The Lancet.
''A expectativa de vida do japonês aumentou rapidamente entre os anos
50 e 60, primeiramente, por causa da queda da taxa de mortalidade
infantil'', explicou à BBC Brasil o professor Shibuya.
Depois, as autoridades concentraram esforços para combater a
mortalidade adulta. O resultado positivo foi, em grande parte,
consequência dessa política de saúde adotada pelo país.
Histórico de sucesso
Hoje, um bebê quando nasce no Japão pode esperar viver até 86 anos se for uma menina, e quase 80 se for menino.
Mas segundo o estudo conduzido pelo professor Shibuya, os japoneses nem sempre tiveram a perspectiva de viver por tanto tempo.
Em comparação com dados de 1947, houve um salto de mais de 30 anos na expectativa de vida de uma pessoa.
Esse crescimento começou no final da década de 50, quando o país passou a experimentar um desenvolvimento econômico acelerado.
No pós-guerra, o governo começou a investir em ações de saúde pública,
introduzindo o seguro nacional de saúde em 1961, tratamento grátis para
tuberculose e infecções intestinais e respiratórias, além de campanhas
de vacinação.
Uma das principais ações foi a redução das mortes por acidente vascular
cerebral (AVC). ''Isso foi um dos principais impulsionadores do aumento
sustentado da longevidade japonesa depois de meados dos anos 1960'',
contou o estudioso.
''O controle da pressão arterial melhorou através de campanhas, como a
de redução do consumo de sal, e uma maior utilização de tecnologias de
custo-benefício para a saúde, como medicamentos anti-hipertensivos com
cobertura universal do seguro de saúde.''
Educação e cultura
Porém Shibuya lembra que o crédito dessa conquista não é só do governo.
''Em 1975, muitas doenças não transmissíveis já estavam em níveis
extremamente baixos em comparação com outras nações de alta renda,
devido em grande parte a uma herança cultural de cuidados com a
alimentação e prática de atividades físicas'', sugere.
Além disto, segundo o estudo, os japoneses dão uma atenção à higiene em
vários aspectos da vida diária. “Essa atitude pode, em parte, ser
atribuída a uma complexa interação de cultura, educação, clima (por
exemplo, temperatura e umidade), ambiente (por exemplo, ter água em
abundância e ser um país consumidor de arroz) e a velha tradição
xintoísta de purificar o corpo e a mente antes de se encontrar com
outras pessoas”, diz o estudo.
''Eles também são conscientes em relação à saúde. No Japão, check-ups
regulares são normais e oferecidos em larga escala em escolas e no
trabalho, a todos, pelo governo'', afirma ainda o estudo. ''Em terceiro,
a comida japonesa tem benefícios nutricionais balanceados e a dieta da
população tem melhorado de acordo com o desenvolvimento econômico ao
longo das décadas.''
Para o cantor de rua japonês Yu Rikiya, de 68 anos, o segredo é o fato
de haver muitas atividades voltadas para pessoas de idade mais avançada.
“Essas pessoas têm um motivo toda semana para continuar vivendo. Fazem o
que gostam, se divertem e não se estressam”, sugere ele.
Além de produzir e vender os próprios CDs, Yu Rikiya canta na noite e
diz que nunca se preocupou com o avanço da idade. ''Temos acesso a
médicos, tratamentos e remédios. Ganho o suficiente para comer e
sustentar a família. Saio com amigos para beber e curtir a vida. Então,
para que se preocupar?'', questiona, sorrindo.
''Quero viver muito ainda, produzir mais música e, quem sabe, ainda ser famoso um dia'', planeja.
Envelhecimento
O lado negativo do sucesso do Japão em conseguir manter a população
saudável é o desequilíbrio populacional. Até agora, cerca de 24% da
população tem mais de 65 anos.
Mas cálculos do governo apontam que, em 2060, a porcentagem de idosos
será de 40%, numa população que se reduzirá dos atuais 127 milhões para
87 milhões.
Segundo o estudo, a expectativa de vida deve aumentar ainda mais, chegando a 84 anos para homens e 90 para as mulheres.
''O rápido envelhecimento da população japonesa é um desafio para o
sistema de saúde do Japão em termos de financiamento e qualidade dos
cuidados'', aponta Shibuya.
''Simplesmente aumentar a expectativa de vida não faz mais sentido.
Devemos focar mais em maximizar de forma saudável essa expectativa de
vida'', sugere.
Outros desafios que o Japão enfrenta são altos índices de alcoolismo,
tabagismo e suicídio, problemas gerados em parte por causa do aumento do
desemprego e do prolongamento da crise econômica.